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Tanoaria

TANOARIA

O tanoeiro especializou-se na arte de vestir o vinho. Um trabalho pesado, duro e sujo, que consiste no fabrico e reparação de pipos, pipas, barris, dornas, balsas, balseiros, cubas, tonéis e outro vasilhame de adega, preferencialmente em madeira de carvalho e castanheiro.

Muito utilizados em Época Romana, raros são os vestígios deste tipo de contentor que chegaram aos nossos dias, dado o material perecível de que são feitos. Foram, contudo, referidos por Júlio César e Plínio, e bastante representados na escultura funerária romana, nomeadamente nas cupae (monumentos funerários em pedra, com forma de pipo ou barril).

Embora o seu uso mais comum fosse para conter vinho, em Época Medieval e Moderna estes recipientes eram também utilizados para armazenar outros líquidos, como a cerveja, e vários tipos de mercadorias. Nas viagens marítimas, por exemplo, transportavam água potável e alimentos sólidos, como carne e peixe seco e salgado, farinha, feijão, entre outros.

As cidades do Porto e Lisboa tiveram regulamentação própria do ofício de tanoeiro desde, pelo menos, os séculos XV e XVI, mas em Penafiel não conhecemos a realidade destes artífices para épocas tão recuadas, e são raras as referências documentais. Apenas sabemos que estes profissionais não foram alvo de regulamentação em 1742, aquando da elaboração do primeiro Regimento dos Ofícios, conhecendo-se apenas um mestre tanoeiro, João António, que em 1762 vivia nas Chans (atual Praça Municipal). A arte de tanoar seria, contudo, bastante necessária e requisitada, considerando os diversos taberneiros e estalajadeiros da cidade que certamente necessitavam de serviços de tanoaria, bem como a existência de várias explorações vinícolas do território que no século XIX se dedicavam à produção e comercialização de vinho, em particular as grandes quintas como a Aveleda, Puços e Calvário.

Considerando que uma pipa pode durar cinquenta anos, o trabalho de tanoaria passa sobretudo por consertos e arranjos, atingindo o seu pico durante os meses que antecedem as vindimas, entre junho e outubro. Os pipos e recipientes correlativos são constituídos por réguas de madeira, denominadas aduelas ou ripas, por fundos ou tampos, e pelos aros em ferro que suportam toda a estrutura. Traçado o desenho na madeira, esta é cortada e presa pelo arco de bastição de cabeça ou moço de pau, que dá forma à vasilha e só é retirado após a inserção da última ripa. Segue-se a colocação da estrutura sobre o fogacho, para as paredes vergarem com o calor, humedecidas, e poderem depois receber os restantes aros de ferro, não sem antes serem apertadas pelo macaco, colocado na parte inferior, em torno da pipa. Por fim fazem-se os fundos, sendo os tampos batidos com um maço até ficaram embutidos. A colocação do segundo fundo exige alguma perícia, de tal forma que dizia o ditado – “o diabo não quis ser tanoeiro com medo de, ao fundar (colocar o fundo), ficar com o rabo preso”! Depois de terminada a pipa faz-se o furo para colocação do batoque que arrolha o contentor, e enche-se de água a ferver, para verificar se está bem vedada. Dois ou três dias depois a pipa é parafinada, aplicando-se este isolamento interior para que a madeira não absorva o líquido ali armazenado.

Bibliografia de referência:

PEREIRA, Pedro Abrunhosa (2017) – O vinho na Lusitânia. Porto: CITCEM – Centro de Investigação Transdiciplinar «Cultura, Espaço e Memória”, Edições Afrontamento, Lda.

SOEIRO, Teresa (2008) – “Ofícios e tradições do Douro”, As Águas do Douro, Coord. Gaspar Martins Pereira. Porto: Águas do Douro e Paiva, SA, p. 155-197.

Tombo das Festas do Corpo de Deus de 27 de Abril de 1627 e de 22 de Maio de 1705, In SOEIRO, Teresa (1993) – O Progresso também chegou a Penafiel. Resistência e mudança na cultura material (1741-1910) – Anexos. Dissertação de Doutoramento em Pré-História e Arqueologia apresentada à FLUP, Porto: edição policopiada.