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Tecelagem

TECELAGEM

A produção de lã e linho está documentada nesta região desde pelo menos a Época Romana, não só pelos vestígios materiais encontrados em contextos arqueológicos, mas também pelos relatos dos autores clássicos que referem a sua utilização no vestuário. Durante a Idade Média continuaram a ser as principais matérias-primas utilizadas na produção de roupa e panos caseiros, sendo também um dos produtos mais comercializados internacionalmente, elevando os mercadores de tecidos a figuras de relevo das burguesias urbanas. Entre os panos, o linho destaca-se pela qualidade e, medido em varas, serviu também como pagamento de impostos e rendas, tal como os cereais e o gado.

Em Penafiel, a regulamentação do fabrico e comercialização de tecidos apenas teve lugar após a criação da vila de Arrifana de Sousa, em 1741, com a elaboração do Regimento dos Ofícios das Tecedeiras em 1742, que se manteve em vigor até 1801. Neste regulamento verifica-se que o trabalho têxtil é eminentemente feminino (aspeto que ainda hoje caracteriza este ofício) e refere-se à produção de linho, embora o comércio de panos de seda, lã e algodão estejam também documentados noutras fontes.

Tradicionalmente, a economia de uma casa de lavoura não se centrava apenas na produção agrícola e na criação de gado. Suprindo as necessidades domésticas, a família dedicava-se também à transformação de produtos como a lã e o linho. O linho era produzido em contexto doméstico e para consumo familiar, utilizado no vestuário, roupas de casa e enxovais, sendo os excedentes depois vendidos nas feiras, em particular no primeiro dia da Feira de São Martinho. Esta realidade alterou-se com a industrialização e o aparecimento de novos têxteis, que provocaram uma diminuição no cultivo e na produção artesanal do linho, hoje residual e quase inexistente. Entre a sua sementeira (final de abril e início de maio), a colheita (dois meses e doze dias depois) e o fabrico do tecido decorre um longo rol de processos preparatórios, genericamente denominados por ciclo do linho. Empoçar, lavar, secar ao sol, maçar, espadelar, assedar, fiar, branquear, etc., são tarefas que envolvem vários instrumentos e o engenho dos seus atores. Se a produção do fio era maioritariamente caseira, já a tecelagem era uma tarefa mais especializada, recorrendo-se ao serviço externo de tecedeiras, nomeadamente para urdir a teia, trabalho que não estava ao alcance de todas e era por isso melhor remunerado.

Já no século XIX, o desenvolvimento industrial da produção do algodão, embora bastante tímido em Penafiel e com reduzida instalação de unidades fabris, na maioria das vezes de curta duração, veio destronar a utilização do linho, que não se adaptou tão facilmente à industrialização. Este manteve a forma tradicional de produção doméstica, realizada por mulheres que acumulavam a função de tecer com as tarefas da casa, o que também contribuiu para o seu rápido declínio na segunda metade do século XX.

Em 1988 contabilizavam-se quarenta e quatro tecedeiras em Penafiel, das quais vinte e seis estavam ligadas à tecelagem do linho e seus derivados. Desde então, o número total de tecedeiras passou a ser cada vez mais diminuto, saldando-se hoje num total de vinte e quatro. Contudo, muitas destas artesãs, pela idade avançada e por motivos de saúde, já não praticam o ofício, sendo urgente a recolha e a transmissão do seu saber-fazer para a preservação deste património. Apesar disso, a manutenção da produção artesanal do linho revalorizou o tecido, bem como o longo e árduo trabalho que lhe está associado, transformando-o num objeto de valor e prestígio para momentos importantes da vida social das comunidades.

Bibliografia de referência:

ANILEIRO, Ana Dolores Leal (2009/ 2010) – O Linho no Concelho de Penafiel. Dissertação de Mestrado em Arqueologia apresentada à faculdade de Letras da Universidade do Porto. Porto: edição policopiada.

ANILEIRO, Ana Dolores Leal (2016) – “Artes dos fios tecidos em Penafiel, histórias de vida”, I SEMINÁRIO: PENAFIEL E PENAFIDELENSES NA HISTÓRIA – Atas. Penafiel: Amigos do Arquivo de Penafiel, ISBN: 978-989-207084.

SOEIRO, Teresa (1993) – O Progresso também chegou a Penafiel. Resistência e mudança na cultura material (1741-1910). Dissertação de Doutoramento em Pré-História e Arqueologia apresentada à FLUP. Porto: edição policopiada.

SOEIRO, Teresa (2002) – El Lino en Penafiel, Norte de Portugal. De la producción doméstica para el mercado a la desilusión industrial, Actes de les V Jornades d’Arqueologia Industrial de Catalunya, Barcelona.